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Frequentemente ouve-se falar sobre os benefícios da música, seja pelo prazer que ela proporciona, seja no aprendizado, no estímulo cerebral, na diminuição do estresse, e tantos mais.
Pouco se fala dos malefícios, ou seja, nos efeitos nocivos que a música pode provocar nas pessoas.
Hoje falaremos de alguns casos em que a música faz mal à saúde, seja na saúde física ou mental, e deve ser evitada. Falaremos também de alguns mitos sobre os efeitos da música, baseando-se em pesquisas científicas recentes.
Musicoterapeuta, musicista, regente
e professora de música
Autora da página Música & Saúde
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A overdose musical
A audição demasiada, especialmente pelo uso constante do fone de ouvido, tem preocupado organizações da saúde em todo o mundo.
Vemos na população, especialmente no meio jovem, a audição ininterrupta de música por várias horas. Sabe-se que a audição musical estimula várias áreas cerebrais, o que pode ser tomado como um ponto positivo, já que este estímulo mantém o cérebro em atividade saudável. O problema reside no fato que, embora tal estímulo seja positivo, em demasia pode sobrecarregar o sistema auditivo e as atividades neurais. Não que nosso cérebro seja limitado, mas é necessário momentos de descanso, para que os processamentos das diversas atividades requeridas por ele ocorram adequadamente. Ao ouvir música constantemente, o cérebro se mantém em atividade complexa, e isso pode sim ser prejudicial, pois gera cansaço, e após um longo dia de audições, a pessoa pode encontrar dificuldade de concentração e até para dormir e relaxar.
Este efeito nocivo se agrava consideravelmente quando a audição é feita através de fones de ouvido, pois estes aparelhos têm um sistema que limita a fuga do som, por isso, a intensidade que atinge o ouvido interno é muito maior.
Segundo alguns médicos, o uso e abuso de fones de ouvido faz com que os jovens tenham um envelhecimento da audição igual a uma pessoa com 60 anos.
Um relatório encomendado pela Comissão Européia alerta que quem ouvir música acima dos 80
decibéis, durante uma hora, todos os dias, tem uma grande probabilidade de ficar surdo após cinco anos. Se a audição de uma hora diária é capaz de todo esse “estrago”, imagine a audição de horas, como é bem comum.
decibéis, durante uma hora, todos os dias, tem uma grande probabilidade de ficar surdo após cinco anos. Se a audição de uma hora diária é capaz de todo esse “estrago”, imagine a audição de horas, como é bem comum.
Em seu recente livro “Alucinações Musicais”, o neurologista americano Oliver Sacks relata vários casos que demonstram os efeitos da música no cérebro humano. Dentre eles, há vários em que os efeitos foram considerados nocivos.
Entre os casos citados, há os chamados earworms (vermes de ouvido) ou brainworms (vermes de cérebro). São casos que podem soar comuns a muitas pessoas, porém, são considerados nocivos e até patológicos quando ultrapassam um nível normal.
Os vermes de ouvido/cérebro são aqueles trechos de música que ficam em nossa mente por horas, até dias a fio. Podem ser desde músicas que gostamos até aquelas que abominamos. Ficar com músicas na cabeça é normal quando elas logo passam, e não chegam a incomodar muito. Porém, quando elas “martelam” nossa cabeça por dias sem parar, podem se tornar insuportáveis e atrapalhar o sono, o trabalho, o rendimento escolar.
Ao fim do capítulo, o autor cita a audição constante a que somos expostos, como agravantes dessa problemática.
Outros casos comuns de efeito nocivo são os ataques epiléticos causados pela audição musical. Ainda no livro de Oliver Sacks, o autor cita a Epilepsia musicogênica.
Desenvolvida geralmente a partir dos vinte anos de idade, segundo estudos, os indivíduos acometidos pela epilepsia musicogênica eram “interessados em música”, ou seja, a música fazia parte constante das suas vidas.
Os ataques ocorridos pelos indivíduos acometidos pela epilepsia apresentavam formas variadas: alguns caiam inconscientes, mordiam a língua, e outros apresentavam breves ausências, mal notadas pelas pessoas ao redor.
Assim também as músicas que desencadeavam os ataques variavam de uma pessoa para outra e poderiam ser desde o rock até músicas clássicas.
Mitos
Por sua característica “agressiva”, muitos falam que o rock não é uma música adequada ao relaxamento, incita a violência, promove agitação, rebeldia, baixo rendimento escolar e tantas outras influências nocivas ocasionadas por sua audição e de outros estilos com características similares (segundo os autores).
Como musicoterapeuta, nunca encontrei nenhuma base científica que corrobore com essa afirmação. Ao contrário, em uma tese de doutorado apresentada na USP, foi realizada uma pesquisa utilizando-se da música Trilogy do guitarrista Ingwie Malmsteen.
No estudo, a intenção era expor crianças com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (hiperativos) à música citada e comparar os efeitos com aquelas que não ouviram.
Ao contrário do que muitos poderiam pensar, os movimentos do hiperativo foram menores durante a música e a análise funcional do movimento revelou que o hiperativo olhou o caderno e escreveu mais enquanto ouvia a música do que em silêncio. O estudo concluiu que a música favorece a diminuição da movimentação em sala de aula e a torna mais atenta.
Segundo a pesquisadora, ouvir a citada música de Malmsteen contribuiu, não para deixar as crianças mais agitadas, mas para diminuir a agitação e colaborar na concentração.
Como vimos acima, não é o estilo da música que exerce influência negativa ou positiva. Nos casos da epilepsia citada acima, muitos pacientes apresentaram ataques ouvindo peças eruditas e músicas “calmas e relaxantes”. Portanto, representa um mito associar de maneira arbitrária os estilos musicais como bons e ruins.
Referências
SACKS, Oliver. Alucinações Musicais: Relatos sobre a Música e o Cérebro. São Paulo: Companhia das Letras, 2007.
Souza, Vera Helena Pessôa. Contribuições ao estudo da hiperatividade: determinação de índices para avaliação de comportamento irrequieto e alternativas de tratamento através da música. Tese apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo para obtenção do grau de Doutor. São Paulo; s.n; 1995. 462 p.
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